sábado, 25 de abril de 2009

O QUE NOS RESTOU?

O que é mais confortável? O que faz mais sentido prá vc? A correria cotidiana talvez remeta a pódiuns de status materialmente privilegiado para alguns... Para outros tantos não concede status, porém alivia as carências materiais e proporciona o justo gozo de pequenos prazeres, ocasionalmente... Para uns isto é suficiente. Para outros isto é mecânico e vazio... Mas o que importa o quão cheia de espaços vazios está a vida humana? Desde que a existência se tornou essencialmente o ato de reproduzir o que foi aprendido pelas gerações anteriores, pouco importa os mistérios da jornada humana no planeta e o sentido da existência. E isto realmente não tem muita importância no dia-a-dia. Do ponto de vista científico, houve grandes avanços nas descobertas de fósseis que comprovam nossa ancestralidade essencialmente negra, nas pesquisas de curas para epidemias e patologias crônicas; na velocidade de disseminação de informações, nas telecomunicações, na alta tecnologia de exploração do espaço extra-terrestre... Do ponto de vista psicológico, ponto do qual me atrevo a dar alguns pitacos por ser assunto de meu interesse e curiosidade de longa data, o inconsciente coletivo parece agir de forma magistralmente mecânica. A maioria dos dias são muito parecidos e o tempo vai passando com o reforço de nossa pequenez e impotência diante da sistemática da vida... Pensava que a vida não era assim, sistemática... Achava que poderia ser feliz um dia, plantando batatas, salsa, cenoura e alface. Vivendo da terra. O que mais nos seria tão mais necessário? O ser humano criou uma série de artefatos, coisas e costumes tão arraigados em nossas cabeças que perdemos nossa essência. Perdemos a relação temporal com o planeta, a relação de claridade e escuridão, a relação de pertencer ao planeta como criatura, como ser vivo.... De pisar com os pés descalços no chão e sentir a terra entre os dedos. De sentar embaixo de uma árvore e se sentir abraçado e protegido. De tomar banho no rio e sentir o cheiro dos minerais e ver as cores dos peixes... De ouvir o canto dos bichos e saber que horas são... De conhecer o formato da copa das árvores e isso ser uma referência de localização, tanto quanto uma placa de trânsito... De perceber a presença de algo ameaçador pelas costas por simples aproximação... Parece que nossos instintos nos traem o tempo inteiro... Nos enchemos de coisas e mais coisas o tempo inteiro... Sufocamos nossa alma com troços, informações, coisas e só o que nos retorna é uma vida vazia, com propósitos vazios, vagos, sem sentido... Emburrecemos. No decorrer de nosso aparecimento neste planeta fizemos uso de nossa inteligência, descobrimos a roda, a pólvora, a luz elétrica, as microondas, o foguete e a internet... Provamos ao mundo e a todas as criaturas o quanto somos bons e inteligentes. Homo sapiens sapiens... E agora... Toda nossa pressão parece ter esgotado enfim a capacidade de suporte do planeta... Sentimos calor quando deveríamos sentir frio, ou mais frio do que deveria, chove muito onde antes não chovia, onde deveria chover não chove... Onde tinha planta, tem concreto e onde ainda não há concreto, certamente, em breve haverá... E na cabeça de um cidadão simples, comum, pode às vezes vir como um lampejo de lucidez, um questionamento incidental sobre seus verdadeiros propósitos... Mas, o que é verdadeiro? Nietzchie se remexerá no além tumúlo ao ouvir tamanha idiotice, afinal, não existe verdade. Mas creio que, essencialmente, de alguma forma, deve existir algo que é de fato uma representação de nossa origem e do que deveríamos fazer bom uso por simples sensatez. Nossa origem é comum a de todos os seres, então o que nos distancia tanto da simplicidade da vida e das coisas? O que fizemos com a nossa existência? Por que viramos essas criaturas-coisas e nos enchemos de objetos? Podemos tentar sair dessa correria desenfreada que criamos e desacelerar nossos passos... Poderíamos tentar voltar ao campo, voltar à mata e lutar contra o andamento do mundo inteiro... Não seria tarefa fácil e aliviaria esta crise de propósitos de forma pontual... Antes, é claro, de sermos completamente rechaçados do ambiente natural pela fragilidade de nosso organismo. Definitivamente, não é assim que caminha a humanidade. Então poderíamos parar de correr e continuar a sobreviver nas sociedades que criamos... Ficar num marasmo com toda a demanda de informações e bombardeio de consumo relampeando nossas cabeças por todos as direções, tempo e espaço... Estaríamos fora da jogada... Porém cheios de ideais. O negócio seria conseguirmos ser felizes assim, cercados, por todos os lados, em todos os lugares, durante todo o tempo... Não vejo muitas alternativas e é com pesar que aqui declaro uma sensação de perda total... Perda da consciência, perda de motivos, perda de perspectivas e perda de esperança. Só não perdi ainda a vergonha. É tudo o que me resta. Talvez o que haja em comum a todos nós, mulheres e homens contemporâneos, independente do tipo de vida, ideais e crenças, seja apenas nossa solidão...

Um comentário:

Philos disse...

Adorei o texto Ana. Seu estilo fora do senso comum mas sem ser histérico nem blasé é arrebatador.

Beijão