segunda-feira, 27 de março de 2023

Vai tudo virar partícula divina no final - Um lampejo de luz na pandemia.

 


        Vai tudo virar partícula divina no final. Experiência divina de recepção e receptáculo de energia luminosa amarela linda. Virando montanha. Firme na base. Conectada com a Terra e com o céu. Um cilindro amarelo de luz entrando do céu pela coroa e saindo pela raiz para o centro da terra. Sensação de eternidade e pequeneza. Um ponto luminoso no espaço. Sensação de finitude na 3D e infinitude no universo. Firme como uma montanha. Uma coruja se queima no fogo. Saudades do meu pai. Voltaria a vê-lo? Onde estaria e como? Um amor imenso por todas as criaturas amadas da minha vida. Entendimento da oportunidade única de estarmos aqui vivos nesse corpo de carne perecível. Clara me proporcionou essa visão. Todos os seres precisam ser honrados pelo papel que desempenham na vida uns dos outros. Meus amigos me são raros. Minha filha me é rara. Minha família me é rara. Meu companheiro me é raro. Meu genro me é raro. Meus amigos animais me são raros. E um amor infinito por todas as criaturas se desmancha pelo meu rosto em lágrimas de amor. As salamandras dançando ao som da 6ª Sinfonia. A chama queimando o velho e inaugurando o eterno. Nova lente, novo conhecimento. Nova experiência. Novo olhar. Obrigada meu pai e minha mãe pelas bênçãos sagradas de me tornar matéria e aspirante à luz eterna. Muita muita gratidão. A imensidão acolhe e amedronta. Pelo tamanho indescritível. Por não saber o que se torna no pós morte. Olhar para todas as criaturas como deuses e deusas, detentoras das lições que preciso aprender, dos estímulos que preciso ter para consertar minhas células danificadas. Para recuperar o brilho e a saúde. Humildade, tolerância e sabedoria. O mais simples é o mais puro. O mais viável. O mais humano. O mais amoroso. O mais difícil. Quanto maior a conexão com a materialidade, mais placas de concreto se grudam à essência, úmida, sensível, sagrada. O caminho de retorno para a evolução fica mais difícil, porém sempre viável e disponível. Basta a criação da consciência que explica a questão dos motivos. Por que estou aqui? O que vim fazer? Qual é o meu propósito? E manter a consciência da respiração acesa a todo o momento. Respirar. Ouvir. Ver. Sentir na pele. Estar no momento presente do aqui e agora. É tudo o que temos e por isso se chama "presente". Os grandes mestres vieram de ou passaram pelo Tibet. Os grandes segredos, ensinamentos e chaves estão armazenados no Tibet. E sem disso saber, há 8 anos, tive meu primeiro contato com os estudos budistas tibetanos  bodhisatva e me senti em casa. Acolhida. Instigada. Em família. Foi sofrido aprender e libertador compreender o funcionamento das leis cósmicas e da coemergência observador/observado. Julgamentos carregados de parcialidade e autopiedade egóica. Conhecimentos valiosos e eternos que transmutam dor e sofrimento em amor e paz.. Entendimento básico da lógica da vida, da existência e do planeta. Um amor imenso pelas criaturas. Uma saudade imensa dos meus amados, amadas e amades. Virar estrelinha. Amar a todes com a consciência de que um dia isso tudo acaba e morreremos para a eternidade. O medo da morte aprisiona. Pulsões de morte intermináveis. Desejos supérfluos que morrem como numa roda interminável de criação e morte, criação e morte. criação e morte. Insaciedade crônica da alma que se traduz em um buraco negro de carência, solidão e pensamentos equivocados. Então há medo da morte. Porque a vivência de mortes sucessivas traz a sensação de morte eterna. Um saco sem fundo. Que não para em pé. Uma sensação de fome e sede sem fim. Fantasmas famintos. Zumbis vorazes. Uma sobrecarga de coisas que não fazem parte do eterno e das leis do universo. Aqui entram as polaridades. Alimentar o corpo físico e o espírito. Alimentar o que é eterno. Achar os caminhos do meio. Sair das pulsões de morte e passar a trabalhar com as pulsões de vida. Sair das bolhas. Seguir o mais observador quanto possível. Poucas palavras. Mais respiração e percepção. Ouvir mais do que falar. Vigiar os pensamentos e expulsá-los quando invasivos e inúteis. Aqui nessa casa mental não entra pensamentos indiscriminados e a própria mente é quem delibera sobre isso. Ser senhor do seu repertório e perspectiva de vida. Viver conforme valores eternos, conforme os atributos das centelhas divinas. O ego precisa caber amorosamente no bolso, delimitado firmemente pela humildade. A decadência civilizatória é fato constituinte da história dos povos na humanidade. Emergência, florescimento, frutificação, expansão, ganância, decadência generalizada e morte. O velho precisa morrer e habitar outro corpo. Outro planeta. Um corpo que seja utilizado como instrumento de evolução e não como norte da existência. Não é sobre corpo essa vida. Mas sobre espírito. E temos o corpo como recurso energético de cura e transmutação de forças. Precisamos cuidar desses aparelhos de aceleração evolutiva que se chamam corpos físicos. Quanto mais cuidado com ele, maior será a chance de prolongar a oportunidade única de viver durante o período de transição planetária de Gaia, curando as células danificadas pelo desamor e pela incompreensão e que precisam se refazer para um novo mundo. Uma nova frequencia. Um novo pensar. Mas ele só chega onde há espaço. Como querer roupas novas quando o armário está lotado de coisas velhas sem futuro? Transmutar todo um sistema de crenças equivocadas para transcender o ego. Meditar disciplinadamente. Olhos e ouvidos bem abertos. Bocas bem fechadas se não houver alinhamento com algo útil. E, principalmente, cultivar o silêncio interno e a paz do momento presente para perceber os sinais do universo. Amor e respeito a toda a criação. Amor e respeito a si, ao corpo físico. Amor e respeito ao outro. Amor e respeito aos budas que aparecem em nossa caminhada para nos ensinar conhecimentos-chave para a descoberta dos mistérios de dentro e de fora. Assim como é em cima é embaixo. Ouvir o vento. Sentir o cheiro da chuva. Pisar com os pés descalços no chão. Rolar no chão. Beijá-lo. Acariciá-lo. Entregar-se a ele com amor e confiança. Reverenciar os sangues que por ali passaram. Lutar o bom combate. Dançar quando sentir vontade. Perdoar e pedir perdão setenta vezes sete vezes. Porque o erro faz parte do processo de aprendizagem e deve-se ser mais compassivo consigo mesmo e com o outro. Muitas lutas, muito suor, muito sangue e muitas lágrimas envolvidas na nossa existência, até que chegássemos até aqui. Somos sobreviventes, guerreiros de luz que andaram pelos vales da morte, da ganância e do egoísmo. Honremos nossa trajetória. Hora de aprender com o passado e recriar um novo sistema de crenças para o bem viver, para a alegria e para a cooperação. Que as bênçãos de nosso divino e amado mestre Jesus estejam em cada coração. Que o querido Arcanjo Miguel nos proteja de todo e qualquer mal. E que venha o tempo onde os humilhados serão exaltados. E que não sejam ouvidas as palavras dor, fome e sofrimento pelas pessoas e nações da Terra. E que a prosperidade e a abundância se vejam em cada esquina. No mesmo dia em que o ser humano confiará em outro ser humano tal como a palmeira confia no vento, parafraseando o poeta amazonense Thiago de Melo. Que venha o resplandecer do despertar da consciência em massa para a quinta dimensão no planeta Terra. Que os canais estejam abertos. Que o amor seja a lei. Gratidão. Ayawaska, Brasília, 17/10/2020.



quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Sobre a covardia humana


O pior de todos os covardes é aquele que incita as pessoas a estarem onde ele deveria estar. Uma parca demonstração de decadência moral causada pelo medo. Medo de se assumir falho. Medo de ser punido. Medo de ser prejudicado. Medo de ser feio. Medo da própria sombra. Medo do próprio gemido surdo e seco.
Gente manipulada é covarde. Um problema para o qual não vislumbro solução pelos próximos 200 anos, salvo algum cataclisma ou evento de extinção em massa. Nem as culpo, porque a cultura do medo é avassaladora. Assista aos jornais, veja quanto sangue derramado! Olhe só como a violência está ao seu lado. Não saia de casa. Não desligue a TV. Compre uma arma. Esteja seguro. Não diga o pensa. Não discorde de ninguém. Não confie em ninguém. Olhe sempre para os lados, pode ser perigoso. Obedeça o que está posto. Deus castiga, está na Bíblia. Nunca saia sozinho à noite. Alguém pode estar lhe seguindo. Você será assaltado, morto, estuprado, esquartejado. Não pense fora da caixa, ela lhe mantém a salvo de si mesmo. Não converse com estranhos, não olhe para o mendigo, não converse com o flanelinha, não sorria para o louco. Se cometeu um crime, esconda, arrume provas contra todos, exalte os tiranos. Tire o seu da reta, salve seu clã. Ensine os seus a agirem assim. Nunca reme contra a maré. Não importa injustiça generalizada, opressão naturalizada e apatia hipócrita. Seja medíocre e salve sua pele. Cada um no seu quadrado. Pise na cabeça dos outros para obter vantagens. Se aproveite da ingenuidade e da fraqueza do outro para massagear seu ego e sair impune. Impressione estranhos com seu poder de obediência e normatização. Não saia para ver as estrelas e a lua. Não abrace árvores. Não dance na chuva. Não invente moda. Não crie nada novo. Não ame sob o céu. Não defenda os mais fracos. Seja desonesto para passar bem. Tenha aparência de "cidadão de bem." Bem normalzinho. Bem enquadradinho. Bem limpinho. Bem retinho e comedido. Bem igualzinho ao que vc viu na TV. Tema subir em árvores e nadar em águas profundas. Calunie quem é diferente. Joque a culpa, faça com que alguém pague o pato. Ajude a extinguir novas ideias e pensamentos. Padronize suas ações e comportamentos. Nivele-se por baixo. Até que vc se pareça com um zumbi, decadente e patético, quase morto, porém vivo, circulando pelas ruas normais da cidade planejada, socialmente higienizada e fria, com seu farrapo de existência em frangalhos, seu espírito de plástico e sua ética de areia, voando ao sabor da conveniência de um protótipo "cidadão de bem". Seja esse zumbi. Mas seja de verdade. Para que as lavas vulcânicas não errem a curva e limpem um monte de vocês do solo sagrado de Gaia. Que um terremoto coma suas vísceras e derreta seus restos de espíritos plásticos no fogo do centro da terra, para que seres dessa artificialeza jamais pisem o solo desse planeta outra vez. Toda a covardia será recompensada. Cave sua cova e aguarde sua vez de virar lixo, que não se reaproveita nem se recicla, que não se aduba e nem se transforma. Só acumula lodo, morte, pequenez e covardia. E que um dia será varrido desse universo definitivamente. Está feito.

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Chuva rara e rala de cerrado e seca

Como somos estupidamente frágeis. E como as relações se tornaram líquidas. Pueris. Não existe metafísica.  Choro com a chuva pra ninguém ver minhas águas. Cada dia mais dificil estar nesse mundo. Cada dia mais dolorido ver que nada do que vc faz fica. Tudo é poeira. O mundo ta chato pra caralho. E dizem que nós escolhemos encarnar nessa época.  Que época sinistra é essa onde as pessoas se comparam umas com as outras o tempo todo, onde o poder vale mais do que o existir, onde o so existir representa pobreza.  Que mundo é esse onde a doação de amor pra uns é obrigação e pra outros, nada. Uma besteira infrutífera e tola. Onde estão meus opositores? Os medrosos? Os hipócritas cagões? Os estúpidos? Os zumbis manipulados superficiais ligados em suas telas o tempo todo? Se desligar a tela, acabou o ser. Desnorteado. Sem rumo. Sem saber quem é. Preguiça de estar aqui nesse tempo de isolamento, provação e solidão. E se não houver nada depois disso, atesto hoje mesmo com minha assinatura energética, que não vale um centavo nessa terra de ninguém, que estamos perdidos. Jogados ao sabor do vento e do acaso... Até que algum acaso feliz nos traga uma centelha de nova ilusão sobre deuses, o além, o amor e as crianças.  E por que as crianças precisam crescer? Por que precisam nascer nesse mundo para serem adestradas como cães doces e inocentes para agradar a ordem? Por que pessoas se sentem melhor pisando nas outras? Que doença é essa? Que defeito é esse da nossa espécie? E como se vive nesse mundo sem amor? Como? Que esse setembro amarelo se suicide de uma vez e que nos reste a esperança de um outro tempo, um sonho outro, uma vida outra. Porque agora, meu coração só quer chorar e doer nessa chuva rala e rara de cerrado e seca. 

quinta-feira, 28 de março de 2019

Sobre esse clichê de ter alguém pra amar

Hj é sobre esse clichê de ter alguém pra amar e alguém pra deixar te amar. Me sinto dodói como quem sabe que não sabe e ainda não encontrou acesso e alento. Sou burra nessa arte e parece que enquanto essa burrice tá aqui, o que me aparecem são pessoas igualmente machucadas que não sabem amar e não têm a mínima ideia de que precisam se curar desse não saber. Sequer buscam... Buscar? O quê? Só há de se viver mesmo. Estamos aqui há milênios exatamente por não saber. E na solidão da madrugada chuvosa me percebo frágil e pequenina. Um dente de leão fofo e volátil que dança ao sabor do vento seco e frio ao minimo sinal de afeto. Afeto que tenho tanto a dar e que queria tanto também receber assim, no corpo, no toque, na pele e num turbilhão criativo do aqui e agora. Meu chakra oprimido é o sexual. Fujo pro coronário sempre que não posso expandir minha energia sexual. Então meu laringeo falha e adoece. Meu plexo fica aberto e vulnerável. A pineal calcifica mais e tenho tanta vontade de chorar e ter algo que não tive no passado. O raiz me chama à conexão como um imã. O cardiaco doendo doendo sangrando. Estar em terra de trogloditas. Pérolas aos porcos. Então me ressinto por ter escolhido vir pra esse estrangeiro terrestre pra fazer não sei o que não sei onde com não sei quem. E me arrependo. E me doi a alma por estar tão longe dos meus. As plêiades. E parece que agora pequenos flashes de memória lêem meus sonhos e me dizem que sou uma sequóia milenar. É que queria tanto que minhas almas gêmeas estivessem por perto. Não consegui amar nenhuma das que encontrei. Então me sinto um eremita com minhas cachorras, livros e internet. Resisto a não procurar conhecer ninguém ao vivo ou ao morto porque tenho tanta preguiça e medo de ferir e ser ferida pela milionésima vez. A casca vai ficando grossa porque o vento vai endurecendo a superfície. Mas por dentro, castelos de areia. Um anseio enorme por uma parceria honesta e sincera. E uma ignorância enorme em amar. Uma inaptidão. Uma coisa estranha e dolorida que não sei lidar. E esse caos mundial. E a necessidade urgente de acreditar no invisível. Tudo o que há. E se não existir nada, prefiro que o engodo me consuma e me preserve a sanidade. Ouço mensagens dos ETs todos os dias E se por um acaso nada disso for real, me retiro desse mundo atestando a infinitude de bilhares de vida sem propósito algum. Dói como uma bezetacil permanente. Como uma laringite calando a voz. Como um aceitar passivo e tosco de uma existência compulsória delegada a compartilhar respirações com trogloditas híbridos estúpidos. Essa convivência dá um trabalho hercúleo.  Então nunca me diga o que fazer. Não me diga aonde ir. Não sugira qualquer templo para frequentar ou odiar. Aprenda a calar. Aprenda a silenciar. Aprenda a observar e ouvir. Dois olhos, dois ouvidos, uma boca. Chateada e me sentindo muito muito só na caminhada. Que o caminhar seja leve, tolo e inútil como somente o privilégio da ignorância pode ser. Uma pílula de amnésia e um anestésico antimonotonia para que ignore meus sentidos e siga feliz com a manada rumo à morte e à autoalienação. Feliz velho milênio outra vez.

sexta-feira, 8 de março de 2019

Um buraco cortando a carne da gente...


Como eu quis chegar onde estou. Resolvida. Feliz. Acordando dando bom dia pras plantas, cachorros, pássaros e humanos. Acordar dando bom dia para os passarinhos. Por já ter ido em um lugar tão fundo onde a luz não chega e a dor sempre é. A velha sensação de não pertencimento que vira e mexe traz aquele vazio no peito, como se houvesse mesmo um buraco cortando a carne da gente no meio e fazendo olhar através. Como um buraco vazando para lugar algum. Esse vazio que volta com força em tempos de carnaval. A festa da carne, onde tudo se mistura, confunde e densifica. A festa em tempos de alegria forjada só mesmo para fingir que a autonomia pessoal é suficiente para determinar: só por hoje serei feliz. Só por hoje serei o que quiser. Só por hoje irei às ruas gritar que minha alma pode cantar e dançar quando bem entender. No carnaval. Vou prá rua gritar pro vento espalhar pro universo em espiral que o mal humano não me alcança, pois sou isso. Humano. Minha carne é meu guia. Minha carne é de carnaval, meu coração é igual. E na espiral decrescente do ralo para onde nossa energia doente, carente e impotente escoa, desce também nosso resto de dignidade. Porque apesar de para alguns sambar representar alguma dignidade, apesar dos pesares, para outros, sambar diante dessa miséria projetada para perpetuar a exploração de uns sobre outros, em carne viva, com veias abertas, com o horror pulsando nos olhos enlameados de chumbo e mercúrio... Não é possível sambar. Não é possível. Não dá. Diante do Fulni-ô amarrado e queimado vivo no Pernambuco... Um fulni-ô. Da mesma etnia dos xamãs que me benzeram há uns meses e me limparam a alma de maus espíritos e maus pensamentos. Um dos que me ensinaram uma dança ancestral tão forte e linda para Pachamama e de quem guardei um chocalho com uma coruja verde tão linda. Uma coruja linda que eles pintaram. E que na falta de referência e impossibilidade de aproximação outra, coisifica no chocalho essas coisas de alma e traz esse alento de gente antiga que sabe cuidar de terra e de gente, e que a gente criado no quadradinho, num "debaixo do bloco" de uma asa burguesa ignorante sequer imagina existir. Queimado vivo. Não posso sambar. Quando uma criança de 7 anos morre de meningite e pessoas comemoram porque foi cortado o "mal hereditário" pela raiz. Hereditariedade operária. Hereditariedade mesma que faz nossa terra continental estar dividida entre capitães do mato. Capitães hereditários dos contos da carochinha. Dos contos dos "felizes para sempre". Dessa classe média brega e imbecil que legitima esse poço sem fundo de desejos dos coronéis de merda que comandam o país e que boicotam com garras, presas e sangue no olho, qualquer possibilidade de um projeto de nação, qualquer chama de distribuição justa de recursos, qualquer esperança de equidade e justiça para todos os guerreiros originários, qualquer tanto assim de mais tranquilidade igual para todos. Legal é ter mais do que o outro e não que o outro tenha o mesmo do que eu. Se for igual prá todos, não ostento. E viver sem ostentar tira o sentido da vida. Não dá prá sambar. Desculpa frevo, maracatu, boi... Desculpa samba, amado samba... Minha carne é de carnaval, meu coração é igual. Trago no peito a dor e a alegria dos artistas. Mas  não dá mais prá sambar em tempos de genocídio indiscriminado. Não dá prá sambar quando um presidente borra botas acha que seu cargo lhe dá o direito de continuar sendo um adolescente inseguro, mimado, burro e burguês escondido atrás de uma rede virtual postando imbecilidades. Não dá mais prá sambar. E ponto. Me recuso. Quero saber onde estão nossas flechas e arcos. Quero saber onde está a tinta de guerra. Quero saber onde estão as ervas sagradas que evocam a gente toda que é sangue do nosso sangue que lutou aqui nessa terra brasilis. Porque estou pronta para a guerra. E não quero mais mostrar meu sorriso no carnaval para quem quer que seja, porque não quero mais dar pérolas aos porcos. Sorrir agora é conivência. Me recuso. Fico imaginando o dia em que multidões dessas que só o carnaval arrebanha se colocarem todas de braços cruzados em silêncio absoluto, observando os babacas que nos acham idiotas tentando nos comprar com algum farelo de pão, uma promoção de migalhas ou uma lasca de circo barato, balançar a cabeça e dizer: "Não queremos mais nada disso. Vocês têm duas opções: fujam para o subterrâneo ou para águas internacionais. Estão exilados de qualquer território." Mas então me dou conta de que eles sou eu também. Percebo que minha dor é a dor deles também. O mesmo vazio. O mesmo buraco que cresce quando chega o carnaval. A diferença está na forma de lidar com seus buracos. Alguns são monstruosos e devoradores, porque têm poder. Outros são mais modestos e, talvez com um pouco mais de poder, destruiriam uns três planetas com seu coração de buraco negro. No final das contas estamos exatamente onde deveríamos estar. Todos estamos exatamente onde deveríamos. Está tudo certo. Nossa casa está caindo como uma hora deveria cair. As vergonhas alheias diárias nos noticiários pondo em evidência exatamente toda a podridão que deveria emergir. Nada precisa ser feito. Há corda suficiente para o auto enforcamento coletivo. Está tudo correndo conforme as leis do universo. Action and reaction. Mas nesses tempos de carnaval minha tristeza não me deixa sambar. Nesses tempos, faço greve. Nesses tempos, evoco meus guias. Oro. Choro. E me recuso. A velha sensação de não pertencimento que vira e mexe traz aquele vazio no peito, como se houvesse mesmo um buraco cortando a carne da gente no meio e fazendo olhar através...

domingo, 8 de julho de 2018

Culpa


Por ser fora da casinha. Por não ser perfeita. Por ser tosca. Por não saber o que fazer com seus talentos. Por não estar inserida no mercado. Por ser mãe de filho vivo. Por não arriscar mais. Por girar, girar e cair sempre no mesmo lugar. Por não ser como deveria, sanguínea, coletiva, cúmplice de todas as horas. Por não ser alegria toda hora. Por não sustentar os holofotes por muito tempo. Por querer se esconder dos humanos. Por não ver mais graça nos humanos. Por se cansar rápido com o mesmo. Mais do mesmo. Pelo medo da ambiguidade. Pela consciência impotente da dualidade. Pela casca que parece grossa, mas é fina. Pela sensação de não pertencimento. Por ser estrangeira. Jupiteriana. Talvez lhe falte foco. Deveria sonhar em realizar coisas. Deveria sonhar com desejos, metas a alcançar. Mas só segue o fluxo, no automático. Inventa desejos que lhes conecte com o mundo. Inventa necessidades irrisórias para se sentir parte. Transita entre grupos, vaporosa. Sumida e aparecida. Porque, na verdade, tanto faz. Só serve se for por algo que faça brilhar. Que acrescente ou inquiete. Os sons são barulho. Ruído. A vista é a mesma. Sempre a mesma. O sem gracismo das necessidades forjadas que só servem para escravizar e continuar fingindo que elas existem. Por não ter um mestre. Por não ter um norte. Por simplificar demais a vida a ponto de não necessitar mais de tantas coisas. Mas de ainda querer tantas coisas. Falsas. Para alegrias ilusórias. Pequenas farsas supérfluas. Então os livros salvam. E aqueles queridos raros da vida também salvam. E a culpa anula. Imobiliza. Indifere. Congela. E pesa uma tonelada. A indiferença gera esquivos. Permissíveis até um limite definido desde o início. Medo de brilhar. Medo de ser injusta. Medo de ser arrogante. Medo de não conseguir chegar a lugar algum. Ser obrigada a inventar sonhos e alcançá-los. Porque ninguém vive sem sonhos. Busca Hermes. E lhe pede um sonho forjado em bronze. Para que pendure no teto como um móbile que lembre diariamente a tarefa de persegui-lo incansavelmente. Constela, faz prece, mandinga, procura relatos de E.T.s, pede forças, acende incenso, defuma casa, tem preguiça de gente mal educada. Porque foi educada na rédea curta. E aquele tanto de alegria não vivida por causa da feiura. Nobreza tem a ver com o avesso. Os pais queriam muita nobreza. Mas esqueceram que o mundo é tosco. E para estar nele, só se virar do avesso. E às vezes precisa se ligar a algo tosco pra não se sentir tão extraterrestre enquanto estiver viva. Desculpa pai, por não ser a pessoa de sucesso que você admiraria e amaria mais. Desculpa mãe, por não viver juntinho de todas. Como um macroorganismo. Acho que no meu ovo tinha muito magnésio. E eu vim assim. Voadora. Profunda. Intensa. Esquiva. E sem lugar. Me salva a arte. A palavra entalada que dá forma a angústia. A dança contida porque o espaço é restrito. A voz abafada porque a lida emudece. O traço curvo e dançante que dá vida ao carvão. A culpa pesada que seca a garganta. E o tempo implacável que derrete as vontades.

domingo, 11 de fevereiro de 2018

Tempos de Guerra




Senhores e senhoras deusas. Estamos em tempos de guerra aqui na Terra. Sou primata, pensante, dançante, inventante, cantante, mulher, mãe e bruxa. Danço ao redor do fogo. Sou brasileira. E me dói esse carnaval. Dói perceber o quanto uma elite opressora ainda teima em perpetuar essa escravidão mental. Quando você abre a jaula de um macaco que viveu uma vida em cativeiro, muito provavelmente ele nem saiba como sair da cela ou o que fazer. Porque a prisão é tudo o que ele conhece. Lá ele tem comida, água e distração. Então tudo bem. Ele sequer pode imaginar o que é capaz de fazer com a própria liberdade. Talvez não imagine quantos saltos diferentes possa inventar, quantos frutos diferentes possa encontrar ou com quantos outros macacos maravilhosos ele pode rir junto até a barriga doer. Talvez não saiba quantos sóis coloridos poderá assistir ou quantos silêncios embaixo de grandes luas laranjas poderão aquecer seu coração. Talvez não saiba da fartura e da potencialidade da mãe terra alimentar bilhões conscientes da simplicidade da vida. Talvez não entenda a imensidão imponente das águas e das vidas oceânicas. Talvez não entenda a complexidade das relações dentro de uma floresta gigante. Talvez não entenda a riqueza que cresce abundante e curativa da terra. Talvez não compreenda a força de se dançar ao redor do fogo. Talvez prefira a segurança do que lhe é familiar. Me dói esse carnaval, senhoras e senhores. Estamos em tempo de guerra. Onde uns enjaulam outros em sua própria ignorância, julgando-se espertos. Mas esquecem-se das leis que regem o universo. As leis de atração. As leis de ação e reação. As leis de regeneração natural do planeta. Somos enjaulados, roubados, estuprados, sugados, violentados, oprimidos, esmagados, humilhados, sangrados e saímos felizes prá aliviar a fundura de nossas dores indecentes, vergonhosas, que vão para além do fundo do nosso abençoado aquífero Guarani. Prá esquecer nossa desgraça. Sem saber que esse tempo de esquecimento acabou. Não cabe mais na nossa história. Não cabe mais no nosso peito essa sujeira embaixo do tapete da nossa mágoa travestida de piadas. Ninguém quer ser triste ou testa de ferro, mas por favor. Sejamos conscientes! Criemos coragem! Estamos em tempos de guerra! Contra todos esses ignorantes, toscos e não-pensantes seres espertinhos sanguessugas. Em guerra com os espertinhos que moram dentro de nós mesmos. Estamos em guerra, macacos!!!!!! Vamos lutar!!! Louvemos nossa história!!! Que as histórias não contadas venham à tona com força e clareza!!! Não podemos mais brincar enquanto nossas condições de vida pioram a cada dia, enquanto não tivermos perspectivas de vida decente para nossos filhos e netos. Não há mais tempo prá brincadeira. São milhões investidos nisso enquanto meia dúzia de seres estúpidos acabam com nossos direitos, com nossa estima, com nossa dignidade. E só os deuses sabem o quanto me dói esse carnaval... Quando acordaremos? Estamos em tempo de guerra! Estamos em tempo de rememoração de nossa história. Quantas pessoas foram assassinadas friamente, quantas mulheres estupradas? Quantos indígenas foram mortos e jogados nos rios, nas florestas? Quantos ambientalistas? Quantos foram escravizados? Quantos viajaram nos porões imundos dos navios negreiros, cheios de ratos, solidão, abandono e doenças? Quantos foram perseguidos? Quantos abusos?

Quantas desapropriações de terras? Quantas mutilações? Vamos esquecer tudo isso e fingir que nada aconteceu porque não é legal entrar numa bad histórica?? Oi? Estamos há exatos 518 anos desde que o primeiro navio colonizador aportou em nossa terra. As coisas melhoraram de lá até hj? Sim, obviamente. Mas às custas de sangue, suor e lágrimas. Quem disse que o Brasil é um país pacífico mente. Tivemos inúmeras guerras, conflitos e movimentos sociais. Tamoios, Aimorés, Iguape, Palmares, Invasões francesas, holandesas, Cachaça, Bárbaros, Muras, Mascates, Sal, Guaranítica, Inconfidência MIneira, Conjurações Carioca e Baiana, Suassuna, Laranjas, Farrapos, Canudos, Revolução de 30, Guerra do Paraguai, Cangaço, Araguaia etc, etc.... Se temos alguma coisa hoje é porque nossos antepassados sangraram, mataram e morreram. E aí uns abutres duma figa dão um golpe de estado na democracia, em pleno 2017 e o que fazemos? Enchemos as redes sociais de um ódio esquizofrênico bipolar ridículo e cansativo e quando chega o carnaval e a bosta da copa do mundo ficamos como estúpidos dando ibope pro esquecimento de nossas raízes. De nossa coragem. Da força de nossos avós. Como me dói esse carnaval. É tempo de respeitarmos e reverenciarmos nossos ancestrais se quisermos deixar um legado de mais solidariedade e respeito pelos nossos seres vivos. Todos com direitos inerentes à vida e trazendo em suas células a capacidade de manter uma diversidade absurda convivendo em relativa harmonia. Já chega de esquecimento. Meus deuses e deusas desse universo imenso: ajuda nosso povo. Dai-nos força e coragem para olhar as dores e as vitórias de nossos avós. Faz-nos sentir o amor e a força de nossos avós. Que consigamos reverenciar o suor, as lágrimas e o sangue sagrado derramado em cada rua construída nessa terra tão massacrada e oprimida. Estamos em tempos de guerra. Sou primata, pensante, dançante, inventante, cantante, mulher, mãe e bruxa. Hoje danço ao redor do fogo. Sou brasileira. E como me dói esse carnaval... Assim é.

terça-feira, 30 de maio de 2017

Cabeças, ego, macarrão e faxina.


Trocando pessoas por livros e filmes facilmente. Com medo de estar sendo sugada por um furacão genético e cultural para ser um eremita conformado e confortavelmente instalado no quadrado que lhe compete a existência. E se paro prá pensar na boa sorte de se ter um quadrado para minha própria loucura, no meio dessa loucura simbiótica generalizada, me sinto feliz. Privilegiada. Direitos respeitados. Não tenho televisão em casa há pelo menos 13 anos e taí uma falta boa que não nos faz. Já temos tantas regras cagadas por outros o tempo todo, como se fosse possível pasteurizar a diversidade do ser e do existir numa grande massona de pizza mussarela e passar aquele rolo compressor com cheiro de alho nas nossas cabeças. Não rola. Cabeças são duras. Algumas de miolo mole e casca dura, casca mole de miolo duro, pensantes, criantes, aprendentes, ensinantes, inventantes. Não vai ter rolo. Não rola. Aqui dentro as regras são outras. E volta logo prá esse mar, oferenda!! Porque tenho sentido que nossa liberdade tá ameaçada. Gosto de caminhar à noite, mas já não me recordo em qual noite não fui abordada por policiais de foma intimidadora. Policiais com metralhadoras nas ruas fazendo o terror e se vc se assusta e diz: "Meu Deus moço, o que tá acontecendo?", então vc ouve um "operação padrão" como resposta. Não, não pessoal. Tem muita coisa mudando. Atenção!! Você dirige sempre com uma sensação de que o carro detrás está no seu banco do carona, numa pressão e violência absurda às vezes prá chegar logo no sinal vermelho, onde todos vão ter que parar. Não sei se eu é que tô ficando um pouco mais fora da casinha ou se essas coisas estão realmente se tornando comuns. Isso não pode ter virado o padrão sem a gente nem perceber. Tempos duros esses. E não sombrios pelos outros, mas porque todo o podre que cada um tem ta flutuando, à vista, sem maquiagem. E é difícil enxergar sem luz. Parece que anda tudo meio poluído, destorcido, nublado. E colocar luz em coisa feia e tosca dói. Finge de cego o olho. Analisa por outras perspectivas para deixar o ego bem aninhadinho, no colinho da mamãe urso. Por medo. Medo de não andar na linha. Medo de sair do script. Medo de ser livre e não saber o que fazer com a liberdade. Medo de ter que traçar o próprio roteiro. Medo de sair da inércia. Medo de quebrar as identidades que escravizam, aprisionam e que tanto atrapalham os entendimentos. Medo de mudar. Medo de sair de casa a noite prá ver a Lua. Medo de descer no gramado com o cachorro. Medo dos "cidadãos de bem" do lado de fora. Medo dos filhos se decepcionarem com o mundo cedo demais, quando são assaltados ou assediados numa esquina qualquer. Medo de olhar pro podre diluído num molho branco de macarrão cheio de larva de mosca doente com cheiro de iogurte estragado. Medo de não chegar água prá um banho antes de sair prá trabalhar. São esses os tempos. Parece que a medida do ego precisa se ajustar ao seu devido tamanho e, enquanto toda a sujeira não for lavada que se faça estado de calamidade humana. Que nenhum ser de telencéfalo desenvolvido saia de seu quadrado enquanto não terminar a faxina. E que o google possa captar as intenções das pesquisas e ser um sábio guru em coisas toscas e nebulosas para ajudar cada um em suas egotrips.

Queria uma passagem pro Tibet, porque la foi o lugar onde minha cabeça inventou que é calmo, leve, livre e protegido. Sei que o meu Tibet ta aqui em mim, e não lá. Sinto que meu coração fica mais mole a cada dia e tenho medo dessa velocidade, porque daqui a pouco não saberei o que fazer com ele. Botar ele num potinho com tampa vermelha de morango com fitinha poá. Não me excluo da condição tosca que inventamos prá nós, mas tem horas que me envergonho de ser humana. Não tem nada a ver com partido, corrente político-filosófica, país, temeres, lulas, bolsomerdas, polícia, coxinhas, mortadelas ou salames... Nada disso. O buraco é mais embaixo. É mais profundo do que se imagina em cada um.

Achava que discernir, refletir, aprender, ler e criticar eram benefícios. Mas sinto que quanto mais faço isso, menos adaptada consigo estar, menos sintonia e paciência tenho prás egotrips perambulando por aí sem nem intervalo prum lanche e um cafezinho que nem tomo. Então leio mais e vou até onde consigo manter meu coração inteiro e em paz. 

Vamos fazer o dever de casa aí, minha gente. Porque se a gente não fizer, o macarrão vai ficar pior, ninguém vai aguentar o cheiro e não vai nem poder sair de casa prá tomar um ar. Era só isso mesmo que eu tinha prá dizer.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Luna Lu Lua Ciana



Pensamento inocente
Alma livre e brejeira
Gargalhada de criança
Fibra firme de guerreira

Calma boa de menina
Alegria de nanã
Raiz rio castanheira
Singeleza de romã

Pureza manhã de sol
Leveza de brisa vã
Luz de estrela e fogueira
Chaleira chá hortelã

Luna lu lua ciana
Flor de liz lima limão
Água lótus natureza
Irmã do meu coração





segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Perdeu o filho matado por engano e virou bruxa


Estava lendo Jodorowsky falando sobre os magos e curandeiros que cruzara seu caminho, seus ritos e fórmulas primitivas eficazes quando ela me cutucou para conversar. Ele tinha 16 anos, era muito querido por todos, deu sua mesada para o avô no interior do Pernambuco quando tinha 10 anos... Fez promessa prá ele aos 7 dizendo que voltaria para buscá-lo dali a 3 anos. E cumpriu a promessa. Voltou, mas não conseguiu levá-lo para São Paulo para perto dele e da mãe. Um policial o matou pensando que era outro. Foi um engano... Morreu por engano...Demorou mais de um ano prá ela se lembrar que não era um vegetal... Mais de dez anos prá conseguir ver um policial na rua sem sentir vontade de chutar, cuspir e amaldiçoar. Foi embora de São Paulo, desgostosa. Vendeu seu barraco a preço de banana e foi para Brasília. Foi vivendo, pequenina, magra, miúda, com olhos vivos e espertos... Voz forte e rouca, mas terna... Muito miúda mesmo. Recomeçou a viver pegando uma menina órfã para criar e por ela vive até hoje. Filha de um pernambucano de 88 anos e 22 filhos, Edilcéia transcendeu a religiosidade... Atende pessoas de todos os lugares em sua casa por suas faculdades curativas e videntes... Veio sentada ao meu lado no pau-de-arara de São Paulo a Brasília. Contou-me toda sua história, como reencontrou 18 dos irmãos após 30 anos longe, como descobriu uma irmã desaparecida pelo programa de rádio e como a casa do pai no interior parecia um acampamento, com colchões por todos os lados... Mais de 100 pessoas entre tios, irmãos, sobrinhos, netos, bisnetos, primos, todo mundo espalhado pelo chão numa alegria sem fim. Falou sobre perdão e perda... Sobre alegria e emoção... Sobre dor e morte... Sobre valor e Deus... Um dia bateu na sua porta um jovem bonito. Pediu que o benzesse e que trouxera um objeto para que benzesse também. Era uma arma... E ele... Um policial... Ela chorou, engoliu em seco e naquele dia perdoou prá sempre o assassino de seu filho e todos os policiais.... Entendeu naquele momento como a vida era passageira, e como o ser humano era frágil.... E como deveríamos nos amar e nos ajudar sempre, sempre... Eu escutando, muito quieta e respeitosa. Pegou minha mão e me disse que tomasse posse da minha vitória. E que acreditasse no valor do meu sorriso. E que não deixasse ninguém me usar de qualquer forma... Que cuidasse bem do meu coração... Que o meu tava guardado e que estava vindo muito em breve... Falou que guardasse a data, 03 de fevereiro de 2013. Minha vida nunca mais seria a mesma. As coisas começaram a mudar mesmo. Não dormi no pau de arara, tinha uma goteira no teto, na direção da minha cabeça, a poltrona reclinava bem pouco... Então vim refletindo, ouvindo música, pensando, olhando o céu... Minha coluna doía, mas meu coração tava confortado. Que mulher era aquela? Como me falara sobre coisas a meu respeito sem me conhecer? Disse que eu teria uma família linda e que via duas alianças, uma de ouro e uma espiritual... Que eu teria um sonho e que deveria procurar uma pessoa entendida prá me dizer o que significava... Esse sonho ia revelar meu destino... Que não tentasse mudar pessoas que estavam presas no mundo material... Que essa missão não era minha... Mas que quando amasse, que pedisse proteção para estar andando na direção certa. Que não caminhasse com minhas pernas, mas com as pernas de Deus... Que se sentisse vazio no coração quando estivesse com a pessoa amada, que isso talvez fosse Deus tentando me livrar de algo.... Que em sua visão, me via linda, toda produzida vestida de branco, olhando no espelho minutos antes de casar, lembrando dessa conversa com ela no ônibus. E que nunca desacreditasse na beleza do meu coração e na humildade da minha alma. Fiquei um pouco chorosa, mas tava escuro, de madrugada, não dava prá ver meu choro. Hoje me ligaram marcando um almoço de trabalho prá amanhã. Tenho muita gratidão por aquela bruxinha humilde, mulher forte, guerreira... Não sei se tudo que ela disse tem sentido, mas a força da sua fé me contagiou de alguma forma... "Toma posse do que já é seu Ana... Toma posse da tua vitória... Teu período de espera acabou." Gratidão.

Um norte, uma bússola, um mapa e uma comida quentinha ao cair do dia...



Se a sensação de não pertencimento aumenta, então você está mais próximo de encontrar a si mesmo. Realidades diferentes. Desejos diferentes. Quando penso que estou me livrando deles, sinto medo. E se eu quiser voltar? E se não der mais tempo de reverter? Anestesiada. Pronta para seguir adiante, sem sentir nada. Nem medo, nem coragem, nem vontade de chorar. Talvez esteja virando um zumbi. Viva, morta. Amigos distantes de vida cigana pregressa e itinerante. Um em cada canto do mundo. Enfastiada de hipocrisia. Só aguentando mesmo minha própria lisura de suportar a mim mesma, o que não é tarefa simples. Cumprindo minhas obrigações. Mas como é difícil viver sem paixões. Pelo que quer que seja. Como é duro entrar na forma e ser exatamente o que esperam de você. Quando será possível criar? Quando será que vai dar? Quando poderei voar novamente? Onde minha missão termina e começa minha liberdade? Desprendimento material. Muito necessário para se apegar e se manter no mundo. Ao mesmo tempo sem compreender bem em que momento exato minha mágoa com o ser humano cavara buracos tão fundos na minha alma. Por que sinto falta deles e também os odeio. Por tanta falta de cuidado. Por tanta falta de educação. Por tanto intrometimento e ignorância sobre a vida alheia e sobre as diferenças. Tudo o que um ser humano não consegue compreender vira repúdio, motivo de motim e de rejeição. E tenho um saco tão cheio disso que talvez tenha transformado essa chateação em um cristal de pedras que carrego no coração sem entender direito como consegui tornar isso tão duro e vivo. Faço o que me cabe da melhor forma possível. Mas se pudesse... Ah, se pudesse voar... Voar prá bem longe de mim. Onde não preciso ser eu ou qualquer coisa familiar. Se pudesse ter esse vazio no meu peito cheio de pedras banido. Virado em flor. E ver essa carência de conversa, de amigos, de amor, de sentido prá vida, de alegria de viver transformada em água correndo sem parar, indo encontrar o oceano infinito do nosso planeta particular imenso e miúdo como um grão de bico azul no universo. Onde é o planeta da inocência? Onde é o lugar onde o coração pode ser puro sem ser massacrado? Onde é o lugar onde um ser confia no outro como a raiz confia na terra? Onde a folha confia no sol, a estrela confia no tempo e o corpo confia nos pés? Se não encontrar seu lugar no mundo é porque você não é daqui. Veio apenas fazer uns reparos. Perdoar os outros. Perdoar a si mesmo pela imperfeição impregnada, dura, doida e doída. Aceitar e perdoar a vaidade de pretender dever acertar e fazer tudo perfeito. Ninguém pode ser isso aqui. E não evolua demais também, senão irá sofrer. Vá devagar. Vá sempre. Perenize o caminhar e viva no presente. Esqueça a lógica materialista, mas saiba entrar no jogo. Sobreviva, mas não viva. Aceite o que não é possível mudar. Considere lutar um pouco pelo que é possível. Saiba lidar com suas próprias imperfeições. Não tenha preguiça de si mesmo, nem da vida, nem dos outros. Não tenha preguiça de criar novos sonhos pra seguir e continuar caminhando. Faz parte do processo a utopia, a imagem do lugar alcançado. Faz parte do processo o não pertencimento. Faz parte da prova. Veremos se dessa vez você dá conta do recado. Sensação profunda de encontro honesto com o podre da natureza humana. Cansada. Queria um bar e amigos queridos rindo e seguindo juntos esses caminhos todos que a alma experimenta sem lembrar que um dia quis que fosse exatamente assim. Sem dicas, nem mestres para facilitar o processo. Só a alma e uma intuição tímida que diz que é assim mesmo e que isso passa. Querendo um norte, uma bússola, um mapa e uma comida quentinha ao cair do dia calejado de luta.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

A última gota




Que a ânsia de vômito não me corroa os nervos. Que o sol não resseque minha pele e meus cabelos. Que a lua não me ponha pra fora as vísceras. Que o tempo não me mate por dentro. Que a seca não me derreta o sangue e a bondade. Que o cerrado não me tire a umidade. Que a dor não me tire o foco. Que o trabalho não seque meus sonhos. Que a brisa não me limpe a mente. Que a vida não me deixe a deriva. Que o sonho não me tire as raízes. Que as raízes não me impeçam o vôo. Que o vôo não me tire o chão. Que o chão não me finque ao centro. Que o centro não me deixe alheia. Que o avesso não me abandone o meio. Que a sinceridade não me escape das mãos. Que minhas mãos sejam sempre vivas. Que meus dentes não destruam a si mesmos. Que minha descrença não seja eterna. Que minha alegria de viver renasça. Que meu peito respire aliviado. Que a beleza me renove a fé. Que o trabalho não mate minha esperança. Que minha esperança me cure o desamparo. Que o amor me inunde o peito. Que meu peito me permita o vôo. Que o vôo me permita ser.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Meu irmão



Leveza de alma de tulipa... Leve como a brisa que toca baixo o chão que precisa ser pisado. Voa centrado, com seu norte de amor e singeleza de ser... Humano. Alma pura de criança. Gargalhada de menino, arapuca de moleque, palhaçada de maluco, piripaque de vedete... Flor da pele sem frescura, sensatez e doçura, brilho no olho de quem vê muito além. Concreto sim. Etéreo também. Loucura muita. Ordem muita também. Tristeza nada. Tristeza... Que nada... Podem levar seus irmãos daqui, nada o fará desistir. Porque nosso tempo aqui é só um intervalo para o cafezinho na eternidade. E um dia estaremos todos juntos em um planeta onde o riso é pré-requisito para a seleção dos professores e as cores do ceú sempre estão lá, sem se misturar, fazendo do dia-a-dia um radiante espetáculo. Lá sempre tem música, dança, tambores, amigos, piadas, cachorros, gatos, árvores, tulipas, margaridas, rios coloridos, peixes, fogueiras, vento, sol e sorriso no rosto. Lá as cabeças se abrem e de dentro voam pássaros sambantes que nadam nas cores de arco íris do horizonte. Tristeza nada. Tristeza... Que nada... Pés de chão e coração de infinito. Gargalhador estrondoso de gracejos sem motivo aparente. Fazedor de corações felizes, de fidelidade canina e humanidade sincera. Nobre coração de leão, de monge, de amigo, de amante, de irmão. Meu amigo, meu irmão mais querido...Todos vamos nos encontrar nesse lugar espetaculoso de riso, coisas lindas e engraçadas. Quem for primeiro prepara a fogueira e a massa do bolinho de piracaí. Quem quiser pode fazer um macarrãozinho também, desde que não seja com muito shoyu... E nenhuma lágrima rolará se não for de alegria, nenhuma boca se abrirá senão para falar poesia, nenhum olho se abrirá senão para derramar sinceras brisas de pétalas de rosas para os ouvidos escutarem a vibração mais pura de cada coração... Tristeza nada. Tristeza... Que nada... Meu amigo, meu irmão de fé, morador do camarote do meu coração saudoso do teu riso cúmplice comprido e barulhento. No planeta azul ou fora dele, estaremos todos juntos em um instante.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Auto afirmação masculina


O cara passa uma vida inteira aprendendo a ser macho, a louvar seu falo como elemento de poder, status e virilidade e quando o corpo começa a falhar parece o fim. Ele entra em parafuso. Porque o envelhecimento do corpo tem um custo benefício, senão não haveria sentido algum em habitar essa terra. O envelhecimento do corpo é proporcional ao desenvolvimento da sabedoria, da alma. Nascemos ignorantes, pequeninos e chorões. Se a vida seguir seu curso natural, morreremos mais instruídos, envelhecidos, sensíveis e sábios. Afinal de contas, deve haver uma compensação aos efeitos da cruel lei da gravidade sobre os corpos. E aí, o apego ao falo e aos elementos representativos de poder a ele associados simplesmente impede o cara de se desenvolver, de ser mais inteligente e sensato. O cara fica estacionado no tempo. Quer cena mais horrorosa do que um quarentão ou cinquentão olhando menininhas de 15 anos com olhos de cachorro faminto? Quer cena mais ridícula do que o cara estar à frente de uma mulher e não conseguir se controlar, nem ao menos perceber se a pessoa está disponível a qualquer tipo de aproximação ou contato para avançar em cima dela, como se ela fosse um camarão empanado? Se o cara não consegue sequer perceber se há qualquer contato visual positivo recíproco, como passa pela cabeça desse ser que ele está liberado para invadir a zona privativa de outro ser? E que feio quando o cara ainda conta vantagens aos outros companheiros quarentões e cinquentões que arrasou no seu último encontro, não? Vergonha alheia demais da conta. O cara acostumado com as pequenas mentirinhas cotidianas... Muito triste. E a pior: o cara no supermercado com a esposa e filhos bicando as pernocas da mocinha estudante de direito, que tem a idade de sua filha do meio. Seria cômico se não fosse ridículo. São solteirões, pais, maridos das mais variadas castas e classes. O que acontece nessas cabeças senão um cíclico ensimesmamento compensatório de frustrações fálicas? Como homens prá lá dos quarenta não conseguem ainda, após uma vida inteira, compreender que o falo é um acessório que vai falhar um dia como a mente, a cabeça, as pernas e tudo o mais? Como não compreendem que estar com uma mulher não é condicionante para serem homens? Como não compreendem que importa à uma mulher o carinho, o respeito, a cumplicidade, a expressão do amor, a amizade, a  ternura? Como não sabem disso? Alguém precisará desenhar? Onde se escondeu a sensibilidade e a doçura? Onde foi parar a delicadeza, a poesia? E a ternura, onde se meteu? E a sensatez? Não entendem que a "careca aparece pro cérebro aparecer", como diria o poeta...
O charme dos homens mais maduros está na sensibilidade, na inteligência, na delicadeza e não no pulo do lobo faminto. Isso é feio, é ridículo, é triste e dá vontade de sair correndo de vergonha alheia. Se você está nessa fase e encafifado com a falha do seu aparelho que você imagina fazer de vc um homem, faça o seguinte: tente ser mais inteligente, menos egoísta, mais atencioso e mais sensível. Você notará que pode sublimar a  perda do seu potencial de performance na medida em que compreender que não precisa de um falo duro para ser homem, tampouco se portar como um cão faminto, sempre à espreita, sempre à caça. Os ganhos em sabedoria e sensibilidade fazem de você um homem. Os ganhos em honestidade e caráter fazem de vc um homem. Os ganhos em inteligência e humanidade fazem de vc um homem. Uma mulher de caráter não se interessa por lobos famintos. Compreenda sua alma. Cuide. Ame. Respeite. Não invada. O espaço privativo da mulher é liberado quando há cumplicidade e afinidade. Antes de olhar o corpo, olhe os olhos. Muito difícil? Compre um carro potente ou uma moto poderosa para dizer ao mundo que vc ainda funciona muito bem, obrigada.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

DORMÊNCIA


 

Alheia à realidade, me furto da complacência de estar sob o céu do sol... Preguiça de vida pequena... Obscura preciosidade... Como enxergá-la? Um estalo poderia fazer da luz um asterisco radiante de certezas... Como se a morte não chegasse aos meus pés nem quando sangrados, cobertos de lama de luta... Como se voar fosse um sonho possível para os anjos que talvez sejamos e fomos... Mas humanos não voam e pássaros não gozam.... Como se a pureza da asa fosse uma marca enterrada viva, esquecida no tempo por alguma liderança pessimista que matou a inocência. Odeio ter que combatê-la... Minha pureza, minha inocência, minha meninice... Coisa mais linda que carrego aqui comigo... Quero ser assim, não, planeta duma figa! E o prazer de viver, de gozar... Talvez seja essa a liberdade plena de sensações, prazeres, já que é dali que nasce toda a história... Quanto custa isso tudo? Não quero mais pagar essa conta. Cansada de pequenez de alma... Quanta invasão dentro do meu peito prá ser alguma coisa que pertença a algo concreto, duro. Que trabalheira. Como uma lasanha com gosto de fungo, como se o prazer enfiado ali tivesse o gosto de coisa antiga. Velha. Mórbida e sem esperança. Todo mundo tinha é que nascer com um dispositivo orientador de direção, um gps embutido na pele... Um gps da vida que dissesse em qualquer situação: "siga em frente", mas não siga como achar que deve. Nada disso. Essa história acabou agora. Siga esse caminho à direita que lá é bom. Vai te poupar da fadiga e os teus estarão te esperando lá com um feijão quentinho com farinha e uma prosa gargalhante pela madrugada adentro... Mas não encontro a direção... Viro cada vez mais uma guerreira resignada. Matando minhas paixões, meus desejos. Matando tudo que possa me causar sofrimento. Desapegando das coisas, das pessoas. E me sentindo sozinha. Não sei em que reino budista devo estar agora, mas se decidir ser uma monja, preciso estar nas montanhas e não aqui. Como certas marcas te cegam por tanto tempo a ponto de nunca detectarem onde é que a roda trava? Porque as bolhas não são translúcidas? Porque refletem o vazio que não dizem nada e que não podemos enxergar? Por que não encontro nada? Não sinto nada. Não rio muito. Não choro muito. Falo pouco. Ouço pouco. Como um zumbi que não sabe em que dimensão está. Certeza de nada. Só dúvidas... É isso o que o tempo traz? Quanta canseira. Coisas trazem sofrimento... A ausência delas também... Pessoas trazem sofrimento.... A falta delas também traz... Vontade de ir embora prá fora de mim e largar esse lamento chato que repete o mesmo tom enjoativo do sorvete de passas ao rum. Quero simplificar a vida e pagar prá ver se dou conta da minha mente e tolero minha própria presença. Só a dança do meu próprio corpo alivia minha mente sem graça, dormente, cansada de estar no lugar onde se enfiou sem saber e do qual não tem a menor ideia de como sair. Tão cansada...

terça-feira, 19 de março de 2013

Dai queijo aos pombos, menina...



Nunca voa a pena...
De gente que não voa...
De ave que avoa e não sabe...
Depenada... Delinquente...

Dai queijo aos pombos, menina!
Dai queijo aos pombos!
Que eles têm asas mas não sabem voar...

Castigo é não voar tendo asa avoada
Voar baixo bicando o queijo do chão...
Viver no asfalto sendo bicho avoado...
Deserdado... Descontente...

Dai queijo aos pombos, menina...
Dai queijo aos pombos
Que eles tão sós ainda não sabem voar

Pena dura, voa baixo, vida longa, vai atrás,
Lava a asa, leva o verso, vai sem medo, vê o cais

Vento cego, lê a brisa, varre o beijo, vem e vai
Invade o devaneio e voa grande, voa mais!

Dai água aos pombos, menina...
Dai água aos pombos
Que eles tão sós querem mais é voar

segunda-feira, 18 de março de 2013

MICROLAMENTO


Colaboração: Ameba de lagartas

                                      Fonte: http://www.pedal.com.br/forum/perigo-ou-nao-lagartas-nas-trilhas-e-estradas_topic27712.html

Todas andavam juntas. Como um macroorganismo de movimentos cuidadosamente sincronizados e rítmicos. Nado aquático aéreo. Coisa linda de se ver. Uma ameba de veludo gigante cor de caramelo subindo pro dossel de uma árvore no meio da floresta. Um grupo de dança de lagartas que em pouco farão a coreografia das borboletas. Não tenho imagem. Porque tenho a sensação de que perderia o aqui e o agora tentando achar um monte de botão. E talvez porque nenhuma máquina pudesse registrar a singeleza, a beleza, a perfeição e a simplicidade natural das coisas vivas. Coisa linda demais de se ver. Todas juntas, trabalhando em uníssono silêncio, como uma onda que precisa de cada gota d'água prá existir em movimento. Essência do coletivo. Espírito de sincronia. Imagem de colaboração e concentração rumo à sobrevivência comum. Aprende a ser lagarta, Homo sapiens sapiens...

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Amor de mãe


 Amor de mãe retalha a alma... Faz o choro vir fundo no peito... Querer não ser esta ou qualquer outra coisa terrena... Voar baixo... Seguir miúda de casaco peludo e comprido prá fingir que é urso e passar despercebida... Sorriso regrado e contido... Olhos tristes e distantes... Ensimesmamento doído de quem não consegue mais se desfazer da dor... A sofrência está na barriga e no peito... Sempre nessa região... A pequena abraça forte o ventre dizendo que não quer ir embora... O choro vem arranhando a garganta, comprimindo os olhos, inchando o peito... E desce sangrando, quente, espalhando dor a cada célula... Mas precisa refazer rápido a força e dizer: "meu amor, minha pequena, a gente precisa ficar longe mais uma vez"... Porque a vida tem dessas coisas... Essa falta de condições... Essa necessidade de matéria... Essa repetição de testes malucos que só quem sabe a razão é quem nos põe à prova... Não seria melhor chegar uma mensagem do além no seu celular com um boletim de desempenho na vida? Sou tosca, não consigo adivinhar coisas implícitas. Quer me dizer algo: diga. Preciso da senha, do mapa, senão fico patinando no mesmo lugar... Patinando sem chão. Quando a vida te tira o chão é um problema... E nada de reclamações, pois tudo corre o risco de ficar ainda pior... Esperar dias melhores é o que resta... E enfiar a cara nos livros prá ter um lugar ao sol com o mínimo necessário para viver bem e feliz, com as pessoas amadas sempre perto. Cansaço, um pingo de revolta, um monte de saudade, um tanto de desânimo e outro tanto de dor conformada e amor contido... Queria sentir um pingo de movimento no rumo dos acontecimentos prá essa série não ficar tão difícil e complicada. Queria não querer virar uma árvore, enraizada, sólida e perene, com os cabelos verdes voando ao vento, tomando chuva e sol... Queria querer mais vida... Queria querer ter fé... Mas hoje não posso... Hoje estou pequena. Hoje quero ficar só. Hoje quero não ser eu... Hoje peço licença para não ser... E só doer...

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Vão da valsa



 
Vão é vão
Valsa é vã
Vai em vão
Valsa vai
Vai em vão
Valsa vem
Vem o vão
Voa em vão
Vai e voa
Voa e vai
Voa em vão
Vão e voa em vão

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Dança do Ventre e Arte

"Dança do ventre é puro exibicionismo. Uma arte vulgar." Já ouvi essa frase algumas vezes por aí. Quando não é anunciada literalmente, soa nas entrelinhas de um "não gosto muito de dança do ventre", aliada a uma cara de nojo e uma expressão bem pejorativa como se fosse uma arte inferior, vulgar ou uma "não-arte". Imagino que pessoas que tenham esta visão ignorem o quanto uma mulher precisa estudar e transcender obstáculos internos e externos para obter uma dança fluida e simples. A jornada é longa e certamente traz inúmeros benefícios para o corpo, para a mente e, principalmente para a alma. Estou no meu caminho, tentando chegar lá. Aonde minha alma possa voar sorrindo e meu corpo traduzir alaúdes, flautas, violinos e derbakes com amor e sinceridade. Com público, sem público. Simples assim. É complicado ser simples. Mas complicar... Ah, isto sim é bem simples de fazer. A dança do ventre liberta o corpo de muitas amarras e expressa a natureza feminina ao mundo, tão massacrada ao longo da história humana. Para afirmar a natureza feminina e legitimar o espaço da mulher no mundo não é preciso provar à sociedade machista que a mulher desempenha qualquer função masculina com destreza e habilidade (com exceção dos trabalhos braçais, é claro). Isto não é nenhuma novidade, convenhamos. Também não é inteligente apelar para a sensualidade como a última bolacha recheada do pacote. O componente sensual da dança é indiscutível, e, cá prá nós, que poeta não cantou a beleza da sensualidade de uma mulher? Seja pelo olhar, pela ternura, pela força, pela maternidade, pelas curvas.... O que seria do planeta sem as mulheres? Não seria. A dificuldade de ser mulher na atualidade consiste em conciliar a natureza feminina mais pura e simples - e acredito que a sensualidade esteja incluída neste pacote - com todas as funções cotidianas e "verticais" que toda mulher independente precisa desempenhar. Díficil assumir nosso lado "mulherzinha mesmo e daí" com a verticalidade compulsória que o mundo exige como um grito forte no ouvido de mães, avós, solteiras, comadres, viúvas, separadas, casadas, tias, professoras, engenheiras, atrizes, advogadas, médicas, astronautas e bailarinas... Quem é vertical demais vira um poço de frieza e racionalidade. Quem apenas sonha não consegue pisar no chão e caminhar. Então, mulheres de todos os biotipos, idades, formas e personalidades: Dancem, pelo amor de Deus! Ignorantas de plantão: curem seus complexos e traumas antes de criticar quem cultiva a flor no deserto. Esta é uma arte milenar, feminina, pura, digna e legítima como qualquer expressão artística.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

O guardinha da Dilma e a seca


Derretendo no meio daquele uniforme pesado e hostil, o guardinha da Dilma está bem ali, parado em frente à rampa do Palácio do Planalto debaixo do sol quente. Clima árido, poeira seca no ar, grama marrom queimado ao redor e... as obras insanamente belas e viscerais de Niemeyer em meio ao sertão de concreto. Tudo arde em setembro. Ouvi dizer que o sertão vai virar mar. E o mar... lavará a seca dessa terra fria, vendida, automática, compulsoriamente burguesa e... seca. O guardinha não tem pretensões: obedece porque seu trabalho escraviza e aprisiona. E aprisionado por aprisionado, já está ali naquele corpo de carne mesmo... Uma camisa de força a mais ou a menos não trará grande diferença. E olhando bem, seu uniforme até que é bonito... Seu chapéu é um pouco grande para sua cabeça, mas protege seu ralo cabelo do sol. Protege a careca também. Então ele passa seus dias e meios-dias debaixo daquele sol para proteger o palácio da presidenta da república. Ás vezes sua pressão cai, então ele sonha em pé, no seu uniforme enfeitado. Sonha que está na beira do Araguaia, com seu próprio barco de pesca e seus anzóis, esperando as bocadas de algum pintado comprido... Mas o sonho vem e vai rápido... É o tempo do colorido que os olhos enxergam voltar ao normal. Ele não pode desmaiar. Então trata de prender a respiração bem forte e soltar de uma vez, numa tentativa de pressionar a circulação da cabeça... Pensa que nada pode fazê-lo desmaiar, nem mesmo a baixa pressão, nem mesmo o sol, nem mesmo a secura, nem mesmo a fome, nem mesmo seu barco de pesca no Araguaia... "Sou muito importante aqui, fazendo o que faço, sendo o que me disseram para ser." Então ele se atenta para os carros que passam e procura adivinhar para onde aquelas pessoas estão indo nas suas correrias diárias... "O velho senhor do caminhão azul deve entregar móveis e aquele carro blindado deve ser de algum senador. Aquele outro amarelo que parece um disco voador deve ser do filho de algum deputado, indo para casa de um amigo celebrar a sexta-feira. Aquela mulher no carro prata estava chorando, dirigindo rápido. Talvez estivesse indo para casa... Ou fugindo dela... Talvez tivesse perdido algo ou alguém. Talvez estivesse sentindo dor de dente ou dor de alma mesmo... Quanta tipo de gente passa aqui na minha frente, cada qual dum jeito, cada um com seu destino... Fiquei assim com um aperto no coração ao ver aquela mulher chorando. Mas ao menos suas lágrimas abrandaram um pouco a poeira seca desse sertão de cimento. Ao menos algo vivo sai desse concreto armado, belo, insano e árido do setembro candango. Ao menos tem algum... ser... humano... vivo... nessa seca desse planalto sem fim." E prende novamente a respiração. Ainda faltam quatro horas para acabar seu plantão seco.

sábado, 2 de julho de 2011

Gralhas e Migalhas

Ora grande... Ora pequena... Às vezes o respeito pelo ser humano nos proíbe a alma de fazer qualquer crítica, qualquer correção... Mas existe uma forma de se comunicar sem que haja equívocos intencionais aparentes. Olhar nos olhos do interlocutor mostra o intuito, revela o jogo. Mas não é qualquer olhar à toa, não. Tem que ser aquele olhar de alma de irmão que não demonstra outra intenção senão a que é perceptível ao invisível. Não há engano. Dúvida tampouco. Isso é tão maravilhoso e confortável porque o que move o andar da civilização é a dúvida... E a dúvida ao mesmo tempo que impulsiona traz uma imensidão de possibilidades e de meias-verdades... É tão bom ter atitudes que não falham... O repeito ao outro não falha. Ser humano não falha, nunca, nunca... Por mais que existam possibilidades de recebermos em troca o desrespeito e a ignorância, pode-se ter a consciência tranquila de que usamos a docência em benefício comum. Mas mostrar o olhar não mostra necessariamente a intenção. Mostrar o olhar que sente intenção realmente revela qual é a intenção. Não tem balela, conversinha fiada, diplomacia, boa vizinhança. Só respeito pelo outro. Pré-requisito básico à sobrevivência com as gralhas que se matam por algumas migalhas de pão e por um lugar ao Sol. O Sol nasce prá todos, mas há aqueles que querem seu brilho todo prá si. Afinal, prá que servem as migalhas se todos trilham um caminho que dará em um lugar melhor ao final? Não digo isto por convicção religiosa, político-partidária ou filosófica. Apenas porque meu coração acende uma luz quentinha toda vez que sou mais gente com qualquer gente. Queria correr o mundo conhecendo gentes, apesar de sempre me esconder delas quando sinto que meu respeito não foi retribuído, ou quando sou tão tola ao ponto de não perceber maldade, inveja e malícia vinda de uma gralha qualquer... Daí me recolho até que uma boa ação em minha direção me prove que apesar de todos os percalços, é preciso paciência e sabedoria com as gralhas... Porque não aspiram nada mais do que migalhas... Que se matem por elas... Mas se um dia precisarem de mim, contem com minha solidariedade e com meu mais sincero olhar de respeito. Não por serem gralhas, mas por carregarem potencial de serem gente. Isso é tudo que posso oferecer atualmente por enquanto... Isso é tudo que aprendi. Interações entre minhas experiências e fracassos, constatações, medos, alegrias, amores, desamores, loucuras e saudades. Antes meu olhar era de menina. E agora continua sendo. Não brigo por migalhas. Mas em minha direção, só quero olhar de alma.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A medida do tempo

Só falta descobrir como é que se vive de sonhos... Assim como quem toca indiferente uma estrela, sem sentir o poder do seu brilho. Não seria esse astro o responsável por uma miraculosa mudança? Por um surto instantâneo de rememoração existencial? Vi Maria com o bebê em cores violetas de neon na aurora celeste em Janauacá. Certamente nunca mais seria a mesma. Mas ainda tinha a carne. Sabia que precisava a ela pertencer por algum sopro de momento na infinitude do tempo. Mas que um dia nada disso mais seria necessário. E os tais elos que nos prendem a este mundo... Parece que aí os nós estão emaranhados. Ter paciência significa perder a noção de tempo terrena sem voar alto. O tempo corre diferente em cada tipo de veia. Mas parece inevitável aprender a compartilhar a mesma noção de tempo. Simples questão de compartilhamento condicionado. E há incompatibilidade nestes ajustes quando as energias são muito distintas. Cada cabeça, um universo. Mas sem disciplina em direção aos ajustes comuns, nada feito. O tempo aqui no planeta é um só. Para a adaptação, para os ciclos biológicos, para a agricultura, para a saudade, para os pássaros, para a dor e para a paciência. O tempo deve seguir uma escala padronizada em todas as cabeças de carne, para que este momento no infinito seja, de fato, compartilhado. Para que o aprendizado seja autêntico e eficiente. Nada de ficar em uma bolha, não, nada disso. A bolha protege, mas isola. Então talvez não tenha como fugir da ordem natural dos terráqueos. Ordem naturalmente transgredida, transposta por ideais de plástico... Mas ser um pouco de plástico talvez funcione como estratégia de sobrevivência de compartilhamento de tempo. Sem ser um pouco plástico, como conviver e compartilhar o tempo comum? Os pensamentos são traiçoeiros ao caminho do meio, porque ao mesmo tempo em que latejam em nossas cabeças de carne a existência de um ideal maior, nos incitam à convivência pacífica com seres destrutivos, egoístas, imediatistas e vergonhosamente materialistas... Idéias de cunho econômico baseadas no consumo e na imagem. A tal crise da racionalidade humana contemporânea que amplia guturalmente a coisificação das pessoas e de seus propósitos... Depois de mais esta crise histórica coletiva, o que estará por vir? Se houver prosseguimento lógico na história da humanidade, após o colapso emergirá um período de trégua e de introspecção reflexiva. Talvez haja colapso maior. Talvez os ajustes do tempo se dêem pelo esforço de uns em abandonar de uma vez a estupidez impregnada e de outros em exercitar a paciência de aguardar o despertar alheio para caminhar sem amarras, mirando o horizonte. Sacrifício dos atentos pelos alheios. A questão é quando exatamente os alheios despertarão? Quando a paciência dos atentos for infinita? Por que a evolução dos toscos depende de sacrifício dos sensatos? Vou fechar meu corpo. Cerrar meus olhos. Tocar as estrelas do meu céu de neon, onde não existe plástico. Só algodão e brisa da manhã no rosto e nos cabelos. Sentirei minhas mãos livres. E minha cabeça de carne será apenas uma cabeça de vento, brilhando em meio a brisa amadeirada das estrelas cor de carmim.

domingo, 29 de agosto de 2010

Amor X Ego



Por que é que gente tem medo de amar? Medo da entrega, medo de enxergar que o outro não é o responsável pela própria felicidade? Medo de estar subjugado? Medo de estar aquém ou além? Medo de ser dominado? Medo de ficar com cara de bobo achando o amor o ser mais lindo do planeta? Medo de acordar de manhã enroscado no outro, de cabelo desgrenhado e olho inchado, sentindo o quentinho da pele e o cheiro natural do sono? Medo de uma noite maravilhosa ao som de uma música romanticamente brega? Medo de amar ser uma coisa meio ridícula? Medo de deixar o coração dominar a mente? Medo de cair e de se machucar? Medo de ceder? Medo de admitir as falhas? Medo de perceber que uma briga não é um duelo e que um recuo ou um ataque de beijos pode solucionar grandes problemas? Medo de sofrer? Afinal de contas, qual é o nosso problema? Por que lutar tanto contra o amor? Nosso ego deveria andar numa coleira, ao nosso lado, sob constante controle. Porque ele existe para garantir o amor-próprio e para isso deve nos acompanhar. Somente. O ego é uma merda porque exclui as possibilidades de transformação da alma e fortalece as muralhas de aço que vamos construindo ao redor de nós mesmos para encobrir as feridas da vida. E ainda reclamamos da falta de amor... Se quando ele bate à nossa porta tratamos de expulsá-lo veementemente em uma afirmação de absoluta dispensabilidade, inutilidade e estupidez. A covardia humana me assusta. E me entristeço em comprovar, mais uma vez, que nosso ego vive a travar uma eterna e estúpida guerra contra o amor.

Esconderijo



Vou me esconder. Fechar esse portão e pendurar um pano do exército de fora a fora prá ninguém enxergar minha perna lá da rua. Não tô em casa. Não tô prá ninguém. Gosto dos animais, de ver as formigas carregando as folhas verdes. Ganhei um cachorro, dei banho, tirei os carrapatos, escovei e fiz uma comida caseira prá dar de almoço. Mas a vizinha reclamou que ele latia demais. Tive de mandar embora. O cachorro foi embora. Meu filho também foi. E agora não posso mais cozinhar. Ele não podia esperar um pouco mais? Minha barriga dói e coça quando lembro que ele era eu. Nasceu daqui de dentro dessa barriga. E agora se foi. E agora não posso mais fazer comida. Como vou fazer feijão com essa dor que nunca pára de latejar aqui no meu peito? Como posso sorrir sem uma fita adesiva grudada nos cantos da minha boca? Como se sorri quando a dor é funda assim? Não gosto de gente. Só de bicho. Um dia arrumo minhas trouxas e fujo daqui. Fujo prá uma caverna. Vou juntar um dinheiro e fugir. Só o suficiente prá chegar no meu esconderijo. Vou cuidar dos cachorros, das plantas, dos gatos e dos papagaios. Não quero ninguém que é gente perto de mim. Porque gente é bicho ruim. E essa dor ainda pulsando aqui dentro... Onde estará meu filho, meu pedaço de minha alma? Onde estará agora que Deus decidiu levá-lo prá longe da vida? Prá longe da mãe? Meu filho, que a luz da manhã te proteja e que toda a natureza conspire para que tua natureza livre e criativa continue a brilhar perto das nuvens, dos bichos e do planeta por onde estiver agora. Ajuda tua mãe a sarar essa dor, meu filho! Ajuda porque não resta muito de vida na gente quando o sorriso se vai. Ajuda, filho, porque o quintal da tua mãe vai fechar. Vou botar um pano do exército de fora a fora prá espantar os clientes. E prá dizer a Deus que eu tô aqui escondida na caverna que inventei. Esperando te ver entrar barulhento pela porta com orquídeas e bambus que achara no mato, cheio de idéias prá enfeitar nossa vida...

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Maria Joaninha...


Joana é uma menina linda! Forte couraça, grande coração! É de menina o seu coração... Incompreensível a capacidade de caber tanta gente e amor num coração só... Grande mulher... Cidadã planetária, conterrânea de Júpiter com breve passagem pela Terra na imensidão do tempo e espaço infinitos... Lampejo de luz, alegria e vida! Chuva de meteoros como um dragão de fogo no céu... Imponente representação de grandeza de alma e pequenez de tolerância com a hipocrisia humana... Que espécie de criatura nos tornamos, criador? Não, não!!! Pára tudo! Pára esse mundo agora que Joana tá sofrendo... Sofrendo a falta das almas nobres e distantes, íntegras e singelas, puras de mente e livres de coração... Mas não há singeleza... Não agora... Porque um dragão quando se zanga pode queimar e soltar faíscas... Mas pode amar como ninguém jamais amou... Ah, minha Joaninha, irmã querida... Fica triste não... Quisera poder te pegar pela mão e pegar carona num meteoro errante desses qualquer no espaço a caminho do nosso planeta... Quisera ter metade da tua capacidade de amar indistintamente... E de ser tão honesta com a vida e seus princípios... Há de ser uma grande personalidade onde quer que vás... Mas lembra sempre, Joaninha, que a Terra crescerá com tua passagem. Não esmorece jamais! Porque um mundo muito bom e justo existe em algum lugar... E não há nada tão efêmero quando a vida na Terra! Fica em paz na tua essência! Porque algum dia... Voltarás prá casa, de todos os lugares, do agora e do sempre, cheia de alegria, estrada e histórias para contar!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Rir... Razão de viver....: O mundo é dos espertos...

Rir... Razão de viver....: O mundo é dos espertos...

O mundo é dos espertos...



Tudo se dissipa ao vento quando o assunto é mais profundo... Nada mais temeroso que o próprio eu... E não tente instigar o confronto... Poucos estão preparados... Poucos assumem os riscos... Poucos querem o real... Poucos querem o espelho que mostra a imagem visceral e pegajosa da carne... O externo é mais bonito... Mais tragável e, veja: Não sou muito mais bonito assim? Veja, meus olhos são lindos, azuis como o céu e mistificam minha alma... Pode olhar através deles... Vc não verá minha alma, mas a alma que quero que vc veja... Esse é o jogo. Assim é a vida. O mundo é dos espertos e bem sucedido é aquele que engana com a maestria de parecer sincero. Use a lógica! Assim é o mundo. E é melhor que vc aprenda a jogar, porque não há lugar prá inocência e ingenuidade. Não há lugar prá entrega. Não há lugar pra burrice. Não há lugar prá amar. Não seja burro! Esteja sempre alerta e engane, dissimule sempre, onde estiver... Porque o mundo é assim... O mundo... é dos espertos.
OBS.: Quero registrar aqui minha mais recente decisão: estou me transferindo prá Júpiter.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Depilação

Ao chegar em meu prédio reparo que abriu uma loja de depilação e imediatamente lembro dos esquecidos pêlos crescidos que já mereciam eliminação há algum tempo. Deixei minhas tralhas em casa e desci para me depilar. A loja estava fechada, com a janela semiaberta. Dei umas batidinhas no vidro para me certificar de que não havia ninguém... Nada... Quando me viro para ir embora uma bendita senhora de seus trinta e poucos anos (como eu, aliás) me aparece de repente na janela com uma cabeça benevolentemente escandalosa e um sorriso de plástico assustador dizendo: 'Olááááááááááááá"! Dei um pulo e me voltei ressabiada. Ela se desculpou pelas portas fechadas, mas como não havia aparecido nenhuma cliente naquele dia, ela resolveu fechar a porta (também não entendi...): "Mas já que vc apareceu, entre!!" - se não estivéssemos em 2010, diria que quase escutei um "nhééééééééééc" de porta de castelo mal-assombrado após a sentença. Diante do clima sombrio e da estranheza do lugar, digo quase por um instinto de sobrevivência que poderia voltar outro dia, que não queria atrapalhar, enfim... A senhora gentileza prontamente responde que será um grande prazer em atender me puxando pelo braço e gritando com a boca pro interior da loja: "Janeeeeeeteeeee! Tem cliente prá vc!!". Respiro aliviada, já que não seria depilada pela senhora gentileza do sorriso de plástico assustador, quando me aparece na porta do corredor a Janete. Uma alemã de quase dois metros de altura, cabeleira crescida até a cintura, bigodes, óculos, jaleco, luvas cirúrgicas e aparelho. Senti manifestações estomacais da minha última refeição, mas o que eu era afinal: uma mulher ou um rato? Janete me perguntou o que eu ia depilar com o timbre e a velocidade de seu conterrâneo Adolf Hitler, e eu disse instantaneamente em resposta: "Axila, meia-perna e contorno, senhora!!" Ela deu um irônico sorriso metálico de volta: " Ótimo! Vc já utilizou a cera egípcia?" Respondo que não, mas que se fosse quente tudo bem. Do Egito... Deve ser boa afinal... Ela abre a cortina de entrada do corredor e me conduz até a cabine dizendo: "Vc vai adorar!" Com um frio na barriga me deito na maca e digo que não vou mais querer depilar o contorno, só a perna e a axila. Ela franze as sobrancelhas e o bigode em um nítido questionamento e digo que melhor não, vou esperar mais uns dias, não está tão ruim assim... A contragosto, Janete vira-se de costas em direção à estante de artefatos macabros depilatórios e... Em um silêncio mortal, sob as gélidas luzes brancas fluorescentes vejo a silhueta da alemã passando a espátula na tal da cera egípcia e levantando o braço como quem levanta um punhal... Eu, de suvaco em riste, dou um pulo na maca e vejo seu movimento congelado no ar: "Você está passando bem? Aceita uma água ou um café?". Digo que não, obrigada, que foi apenas um soluço... Que poderia prosseguir... Neste momento lembro-me apenas do calor da cera em meu suvaco e do suor escorrendo pela minha testa, bigode e barriga (não necessariamente nessa ordem) e solto um uivo de pavor e pânico!! Ela pula prá trás raivosamente assustada: "Nossa, vc está meio nervosa, hein? A cera está muito quente?" Dou uma risadinha sem graça e digo que "Não, imagina! Só um pouco aquecida demais, não é?" Ela limpa o suor de seu bigode, puxa um banquinho e diz: "Então vamos aguardar um pouco!"... Silêncio infinito... Nenhuma pergunta prá quebrar o silêncio me vem à cabeça, então fecho os olhos e finjo que estou muito concentrada em mim mesma... Ela quebra o silêncio enrolando a espátula na cera pegajosamente quente e levanta novamente o braço como quem pica cenouras para um ensopado. "Agora deve estar no ponto!" - diz decidida. Lasca-me então a espátula no suvaco direito com a cera caramelizada deixando mil fiapos pelo ar e imediatamente tenta resgatá-los (os fiapos), como quem se livra de moscas... Fico estupafata olhando a alemã degladiando-se com a espátula em riste e os fiapos de cera egípcia no ar, vendo pouco a pouco sua cabeleira se tornando um verdadeiro turbante de cera. "Meu Deus!" - penso com meus botões - "Essa moça vai virar uma múmia e meu suvaco a Mata Atlântica! Preciso sair daqui!". Então interrompo a batalha dizendo: "Olha, Janete! Não precisa mais depilar minha perna, não, tá bom? Eu nem ligo prá depilação na perna, só queria mesmo era salvar o meu suvaco. O que me diz?" Ela vermelha, suada e ofegante diz: "Ah, não! Agora que já comecei, vou terminar, né? Quero dizer... A gente aqui tem muita experiência na área e gosta de fazer tudo com calma, devagar e bem feito prá satisfazer nossos clientes, a senhora me entende, né?". Elevo pedidos de paciência ao meu Santo Guerreiro Expedito e sucumbo covardemente: "Ok, Janete. Vamos terminar." Janete, a estas alturas de turbante, jaleco, aparelho e óculos egipciamente encerados, troca a espátula pela pinça e começa a puxar os fios remanescentes do meu suvaco, fazendo a gentileza de me beliscar a cada puxada de pêlo. Imaginei que na Idade Média esta deveria ser uma boa estratégia de tortura. Já estava perdendo a paciência quando ela dá por finalizado o serviço suvaquesco. "Agora as pernas" - diz ofegante e quase satisfeita, para meu sofrido alívio... Troca a pinça pela espátula, enrolando-a na gosma egípcia e quando vai retirar a espátula do pote, voa um naco de cera quente na minha coxa e na saia. Dou um pulo e ela imediatamente se defende: "Ai, me desculpa! Às vezes acontece essas coisas, né? Hehehe!" Agora a vermelha e suada de raiva era eu e digo que estou com pressa, que preciso ir embora e ela diz que terminará tudo em dois minutinhos mais. A mesma ladainha do suvaco se repete com as pernas, cera quente demais, beliscos com a pinça, fiapos de cera egípcia voando pela cabine e por fim, uma solução de álcool gel para fechar os poros. Só me lembro de sentir tamanha sensação de ardência quando dormi na praia há alguns verões passados... Já tava quase mandando a Janete ir passear na Alemanha ou no Egito, fazendo bom uso da gentileza, começo a me calçar para ir embora resignada, porém depilada (que tristeza), quando a senhora gentileza enfia a cabeça grande e benevolente na cabine perguntando: " E aí, gostou?" A alemã me olha de soslaio e digo que está tudo bem agora. Eu e minha solidariedade ridícula... Vai que a alemã perde o emprego, enfim... Saio da cabine com raiva, doída e triste, pergunto à senhora gentileza na recepção de quanto foi o prejuízo e vou embora de suvaco armado deixando-a com uma ficha de cadastro por preencher na mão e uma cara de interrogação no sorriso assustador.